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terça-feira, 29 de maio de 2012

Qual é a dor que mais dói?


Gosto muito dos textos da Martha Medeiros, jornalista e escritora brasileira.

Em um de seus textos ela fala sobre “a dor que dói mais: a saudades”. Sentir saudades é inevitável em nossa existência. Sentimos saudades de uma pessoa, de um lugar, de um animalzinho de estimação e até mesmo do gosto de um sorvete de nossa infância. Sentir saudades é um bom sinal de que gostamos do que nos faz falta no momento. Somos passado, presente e futuro ao mesmo tempo. Então, quando sentimos saudades no presente (falta), estamos ligados ao passado (lembrança) e ao futuro (o que fazer com essa saudade? ver fotos das pessoas ou animaizinhos queridos, procurar por algum sorvete parecido com o da infância, revisitar lugares que nos tragam memórias…).

“Trancar o dedo numa porta dói. Bater com o queixo no chão dói. Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um pontapé, doem. Dói bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua, dói cólica, cárie e pedra no rim. 

Mas o que mais dói é saudade.
Saudade de um irmão que mora longe. Saudade de uma cachoeira da infância. Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais. Saudade do pai que já morreu. Saudade de um amigo imaginário que nunca existiu. Saudade de uma cidade. Saudade da gente mesmo, quando se tinha mais audácia e menos cabelos brancos. Doem essas saudades todas.

Mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama. Saudade da pele, do cheiro, dos beijos. Saudade da presença, e até da ausência consentida. Você podia ficar na sala e ele no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá. Você podia ir para o aeroporto e ele para o dentista, mas sabiam-se onde. Você podia ficar o dia sem vê-lo, ele o dia sem vê-la, mas sabiam-se amanhã. Mas quando o amor de um acaba, ao outro sobra uma saudade que ninguém sabe como deter.

Saudade é não saber. Não saber mais se ele continua se gripando no inverno. Não saber mais se ela continua clareando o cabelo. Não saber se ele ainda usa a camisa que você deu. Não saber se ela foi na consulta com o dermatologista como prometeu. Não saber se ele tem comido frango de padaria, se ela tem assistido as aulas de inglês, se ele aprendeu a entrar na Internet, se ela aprendeu a estacionar entre dois carros, se ele continua fumando Carlton, se ela continua preferindo Pepsi, se ele continua sorrindo, se ela continua dançando, se ele continua pescando, se ela continua lhe amando.

Saudade é não saber. Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como frear as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche.

Saudade é não querer saber. Não querer saber se ele está com outra, se ela está feliz, se ele está mais magro, se ela está mais bela. Saudade é nunca mais querer saber de quem se ama, e ainda assim, doer.” 

(Martha Medeiros)


Tem uma dor que é a que mais dói. A dor das coisas mortas. A dor final. Uma dor em estado bruto, que não se mistura a nenhum outro sentimento. Ela é simplesmente dor. Não há ansiedade, nem culpa, nem medo. Uma suspensão de pensamentos e elaborações. Apenas o fim, que não nos dá direito de resposta. Pedaço arrancado às brutas. Que nos deixa engasgados. E o que resta é nada mais que a missão de enterrar, de esquecer. De jogar a terra, dar as costas e seguir adiante.


Essa dor expõe o maior de todos os vazios, a maior de todas as nossas fragilidades. Nossa impotência diante do que é fatal. Diante dos vários fins que a vida vai dando ao que amamos, seja lá o que amamos. Dói quando nossos afetos morrem. Quando as amizades terminam, dói. Quando relacionamentos acabam. Dói a morte das nossas paixões, mesmo aquelas que a gente sabia que não teriam vida longa. Dói o fim dos nossos ciclos, de término tão previsíveis. Dói quando acaba o colegial, depois a faculdade, e os amigos se vão. Dói quando é preciso deixar uma casa, uma cidade, um país. Quando fazemos as malas e mudamos de direção, a vida que a gente tinha acabou de morrer.

A vida vai pontuando o fim de cada uma dessas coisas com seu dedo de foice. Não dá para fugir. Não dá para conter o curso dos acontecimentos. Viver é estar constantemente de cara com a morte. E o impasse nos é dado a cada perda: como enterrar aquilo que não queremos deixar para trás? A dor que dói mais talvez seja essa, na verdade. A dor de deixar morrer. De enterrar dentro da gente aquilo que já nos foi tirado. Jogar a última pá de terra, virar as costas e seguir em frente.

É preciso não se sentir culpado por aceitar a morte. Por ainda estar vivo e ter a possibilidade de ser feliz. É preciso perdoar a vida, e até mesmo perdoar o que partiu, pelo abandono não intencional. É preciso aceitar e entender que o tempo fará seu trabalho de restauração, e que isso não significa uma ingratidão com o que se foi. Não é uma crueldade enterrar os mortos. Cruel é seguir carregando-os vida afora.
http://desembolandonovelos.blogspot.com.br/

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